Terra da experiência humana
Filhotes e amigos(as), que excelente oportunidade a de participar da vida no planeta junto com vocês, que os nosso dias se estendam até a senioridade.
A vida humana é desafiadora, e parte da nossa relação com os desafios é permeada por fantasias. Estas fantasias atravessam as diversas narrativas, e a sociedade contemporânea é particularmente suscetível a um volume considerável delas. Não busco desvalorizar a imaginação, pois os antigos a usaram para sobreviver, e nós fazemos o mesmo. A imaginação é fundamental na instrumentalização da criatividade, na percepção do sutil, na busca pelo significado.
Às vezes, nos confundimos e não percebemos que estamos imaginando e fantasiando, chegando a apresentar nossas teses como se fossem experimentos observáveis por todos. Discernir o que pensamos daquilo que efetivamente sabemos é saudável. Manter-se flexível em relação ao que sabemos é ainda mais saudável. Esta é antes de mais nada uma autocrítica na distinção entre fé e esperança, em face da experiência direta. Além disso, reconhecer que temos diferentes experiências de vida.
Proponho que o primeiro passo para se aventurar em temas relacionados à espiritualidade ou ao paranormal seja o reconhecimento da vida no planeta. Distingo aqui a espiritualidade de outros fenômenos. Ainda que não vá me aprofundar agora sobre o que entendo por espiritualidade, posso afirmar que não a considero algo relacionado à ampliação dos sentidos. Se um gato ouve ou percebe espectros diferentes dos humanos, isso não o torna mais espiritual.
As conversas que temos são conversas humanas, e assumir que sejam universais é um erro de antropomorfismo. Isso significa atribuir formas humanas a fenômenos observados, baseando-nos em nossa imaginação. Fantasiar, nesse caso, seria criar uma narrativa ancorada nessa imaginação. Expandir esses discursos para o campo filosófico torna-se antropocêntrico, e imaginar que algo saído da boca humana não carregue um viés antropocêntrico é, em si, uma fantasia. Falamos sobre o que sabemos e imaginamos coisas sobre o que não sabemos. E tudo bem.
Sei algumas coisas, por exemplo, que vivo no planeta Terra. Sou humano. Somos humanos! Nascer no planeta Terra é semelhante a ser uma bactéria no estômago: a bactéria se alimenta do que encontra ali, assim como nós, terráqueos, nos alimentamos do que está no planeta, e metaforicamente, até uns dos outros. O impulso me leva a quase entrar em questões éticas, mas vou me conter, porque acredito que a ética esteja de certa forma ligada à espiritualidade.
Ao discutir linguagens, verdades e significado, estou refletindo sobre os fenômenos humanos, reconhecendo nossa comunicação, nosso antropomorfismo e fazendo referências tanto às sabedorias quanto às fantasias. Se alguém se considera originário das Plêiades, isso me parece uma fantasia, mas não estou dizendo que seja uma mentira. Tampouco afirmo que a narrativa esteja errada ou que não tenha sabedoria. Ao contrário, digo que a ferramenta usada para construir esse discurso é a imaginação. Não perceber isso é o que chamo de religiosidade dogmática. E tudo bem, possivelmente nós somos menores do que pensamos ser individualmente e realmente importantes coletivamente.
Podes atar as cadeias das Plêiades, ou soltar os atilhos do Oriom? João Ferreira de Almeida, livro de Jó (38:31)
Estou aqui. Sou humano, somos humanos, e não há humanidade como conhecemos hoje sem o planeta Terra: esse é o passo inicial. Nos limites do conhecimento, uso a imaginação como ferramenta para compreender o mundo. A filosofia, o desenho, a pintura, a música, o teatro na infância... Ao racionalizar, estou simbolizando, dando forma, humanizando o planeta. Somos um agente coletivo de grande impacto em nossa casa, a Terra. Nosso corpo é o planeta, pois dele é feito. Nossa existência material na Terra é inseparável do planeta. Nosso corpo precisa das condições que a Terra oferece para sobreviver. Primeiro passo: somos filhos da Terra, o planeta água. A primeira pessoa de nossas vidas é a mãe, no útero cheio de líquido: passo um.
O segundo passo elabora-se ao longo do mistério da vida, onde elegemos nossos interesses e aquilo que nos importa. Wally Brown ensina a cultura do povo Navarro sobre o caminho da beleza, um comportamento que compreende a vida como um todo, Believe in The Holy People... On Your Beauty Way Path. Krishnamurti elabora algo semelhante em Liberte-se do Passado:
A beleza reside no total abandono do observador e da coisa observada, e só pode haver auto abandono quando há austeridade total, não a austeridade do sacerdote, com sua rudeza, suas sanções, regras e obediência; não a austeridade no vestir, nas ideias, no alimentar-se, no comportamento — porém a austeridade que consiste em ser totalmente simples, que é a humildade completa.
Estamos num caminho belo, ao reconciliarmos a ancestralidade, as circunstâncias familiares, os relacionamentos, os traumas, a vida no planeta, enfim, a experiência humana.
Foto: longboard clássico durante o COVID, na praia da Macumba, Rio de Janeiro
Interessante a forma que traz sua narrativa.
Aguardando ansiosa sobre a espiritualidade.